quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O que mais você quer?



Era uma festa familiar, dessas que reúnem tios, primos, avós e alguns agregados ocasionais que ninguém conhece direito. Jogada no sofá, uma garota não estava lá muito sociável, a cara era de enterro. Quieta, olhava para a parede como se ali fosse encontrar a resposta para a pergunta que certamente martelava em sua cabeça: o que estou fazendo aqui? De soslaio, flagrei a mãe dela também observando a cena, inconsolável, ao mesmo tempo em que comentava com uma tia: "Olha pra essa menina. Sempre com essa cara. Nunca está feliz. Tem emprego, marido, filho. O que ela pode querer mais?"

Nada é tão comum quanto resumirmos a vida de outra pessoa e achar que ela não pode querer mais. Fulana é linda, jovem e tem um corpaço, o que mais ela quer? Sicrana ganha rios de dinheiro, é valorizada no trabalho e vive viajando, o que é que lhe falta?

Imaginei a garota acusando o golpe e confessando: sim, quero mais. Quero não ter nenhuma condescendência com o tédio, não ser forçada a aceitá-lo na minha rotina como um inquilino inevitável. A cada manhã, exijo ao menos a expectativa de uma surpresa, quer ela aconteça ou não. Expectativa, por si só, já é um entusiasmo.

Quero que o fato de ter uma vida prática e sensata não me roube o direito ao desatino. Que eu nunca aceite a ideia de que a maturidade exige um certo conformismo. Que eu não tenha medo nem vergonha de ainda desejar.

Quero uma primeira vez outra vez. Um primeiro beijo em alguém que ainda não conheço, uma primeira caminhada por uma nova cidade, uma primeira estréia em algo que nunca fiz, quero seguir desfazendo as virgindades que ainda carrego, quero ter sensações inéditas até o fim dos meus dias.

Quero ventilação, não morrer um pouquinho a cada dia sufocada em obrigações e em exigências de ser a melhor mãe do mundo, a melhor esposa do mundo, a melhor qualquer coisa. Gostaria de me reconciliar com meus defeitos e fraquezas, arejar minha biografia, deixar que vazem algumas ideias minhas que não são muito abençoáveis.

Queria não me sentir tão responsável sobre o que acontece ao meu redor. Compreender e aceitar que não tenho controle nenhum sobre as emoções dos outros, sobre suas escolhas, sobre as coisas que dão errado e também sobre as que dão certo. Me permitir ser um pouco insignificante.

E, na minha insignificância, poder acordar um dia mais tarde sem dar explicação, conversar com estranhos, me divertir fazendo coisas que nunca imaginei, deixar de ser tão misteriosa pra mim mesma, me conectar com as minhas outras possibilidades de existir. O que eu quero mais? Me escutar e obedecer ao meu lado mais transgressor, menos comportadinho, menos refém de reuniões familiares, marido, filhos, bolos de aniversário e despertadores na segunda-feira de manhã. E também quero mais tempo livre. E mais abraços.

Pois é, ninguém está satisfeito. Ainda bem.

(28 de maio de 2006 - Martha Medeiros)

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Censura particular



Acredito já ter falado isso aqui ou com certeza, com algum leitor que me confessa na intimidade que dá um pulinho aqui vez ou outra: eu escrevo bastante, mas nunca gosto do resultado. Assim, arquivo tudo em e-mails, gavetas e cadernos pensando que quando sair algo de meu agrado, ai sim postarei.
O mais engraçado é que ninguém me obrigou ou pediu para construir esse espaço. Ninguém me cobra por postagens e nem ao menos sei se há interessados anônimos em ler meus textos. Porque tanta censura, então? Tanta vergonha, tanto controle de qualidade em algo que é meu, me pertence e faço o que bem entender?
Logicamente sabemos que publicar algo na internet é a maior exposição nos dias de hoje, mas porque tenho tanto receio desse julgamento?
Ficarei muito feliz em saber que alguém gostou do que escrevi, mas em caso contrário, que parta para outra busca. Há tanta coisa interessante por ai, em meio as bestialidades.
Minha vontade é tentar descobrir quando e porque se perdeu em mim a idéia original desse espaço que permanece na descrição: “Escrevo por necessidade, ainda que ninguém leia. Escrevo para me esvaziar de palavras e me encher de mim mesma.”
É isso, tentarei ser menos seletiva com a publicação de meus desvaneios... tentarei controlar essa minha censura particular.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Janelas coloniais amarelas




Reparei na casa de janelas coloniais amarelas,
fica em uma rua bem movimentada, que sofre com trânsitos nos fins dos dias e
alaga com qualquer chuva tropical

Quando eu era mínima e ainda tinha algum contato com meu pai,
ele trabalhou em uma loja ali, em uma das casas de janelas coloniais amarelas...
No segundo andar da loja havia uma rede e as janelas na época não eram amarelas,
por isso não deviam me chamar a atenção.

Tive vontade de morar ali,
me pareceu a casa mais confortável do mundo!
Botar aquela rede em seu segundo andar e escancarar... as janelas!

Ela me marcou depois de tantas anos passando ali
simplesmente por suas janelas coloniais... amarelas!


Obs: Imagem do Google representando as janelas amarelas que na verdade nada tem de iguais a essa... além da cor.

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Cadê?


Há quanto tempo não te encontro não é mesmo? Faz tempo você sumiu sem avisar...
Sobraram lembranças e vontade de te reencontrar
O papel continua nu, esperando ser vestido por letras, palavras e enfim, frases
Mas você não vem, não dá as caras a quem, você sabe, só quer te usar...
A quem quer receber todo o mérito as suas custas,
a quem só sabe escrever há tempos sobre sua ausência
Então querida Inspiração, quando vamos parar de brincar de pique - esconde?